UNIÃO IBÉRICA
Julgo oportuno esclarecer que a minha tese sobre a União Ibérica – aqui publicitada com início em 2002 – nada tem a haver com qualquer «recuperação» das anteriormente falhadas. Desta vez, trata-se de envolver as três regiões, portuguesas (Continente, Madeira e Açores) e espanholas (Continente e as suas ilhas) num processo de soberania comum. Concretamente: «Uma federação de estados autónomos regidos por uma constituição de regime presidencialista». Entretanto, nesta fase de debate continua-se a expor opiniões – de controvérsia, de independência, de interesse académico e de concordância – que se divulgam com a maior isenção e total livre arbítrio.
VISÃO PORTUGUESA
DE CONTROVÉRSIA: General Silvino Silvério Marques, em entrevista, “Diabo” 23/10/90, «Portugal é já, na Europa, uma região, das mais antigas, das mais consolidadas. Preservar a unidade de oito séculos daquilo que é hoje Portugal constitui a prioridade de uma política de independência nacional». Porém, mais adiante, parece ter dúvidas... ao admitir uma evolução... Vejamos, o que o ilustre general diz: «A regionalização de Espanha, que se compreende face à variedade cultural que integra as suas parcelas, correspondeu às reivindicações das mesmas e foi julgada certamente como a melhor solução de manter uma unidade que de qualquer forma ficou mitigada. Não temos que intervir nos níveis para que eventualmente evolua a situação tomada, a menos que nos sintamos a ser envolvidos em tal evolução... Se isso acontecer, devemos responder na mesma moeda: não nos faltam situações e exemplos históricos que permitam apoiar ambições de crescente autonomia e de separatismo que tradicionalmente se têm revelado em relação a Castela».
Doutor Paulo Portas, “El País 26/05/02: «Lanzo duros ataques contra José Maria Aznar cuando este se desplazó a Lisboa para apoyar en plena campaña electoral al ahora primer ministro, José Manuel Durão Barroso. Portas criticó que Aznar viniera a Lisboa a dar lecciones de cómo dirigir el país y, en su habitual sono populista, exclamó: «Portugal no está en venta, senõr Aznar!”».
General Carlos Azeredo, extracto de carta a mim dirigida em 28/09/02: « Se quasi sempre estou de acordo com o que expões, mentira seria se Te dissesse que concordo contudo o que escreves, amizade e admiração aparte, incluindo a tua ideia, já velha, da “União Ibérica. E se não concordo, não é por tradição patrioteira, mas porque tenho meditado sobre o assunto à luz da História e sobretudo, em confronto com as realidades que continuam a reger as nações».
Doutor Almeida Santos, 2002/03: Numa primeira opinião expressa a dúvida: ...«faz sentido copiar uma união dentro de outra?». Mais tarde, num segundo contacto, considera a tese da União Ibérica, dentro da União Europeia uma «irrealista utopia»; acrescenta... «ao contrário: é a Espanha que vai desmembrar-se, talvez numa Federação de Estados Espanhois!»
Vice-Almirante António Emílio Ferraz Sacchetti, Janeiro 2003, é contra «a criação de uma diluição da nossa Soberania»... acrescenta que a tese da UI «seria uma maneira de voluntariamente prejudicar o caracter e a identidade da unidade cultural e histórica portuguesa que, naquele mundo maior (UE) continuaremos a querer preservar e que até é imperioso reforçar». Porém, mais adiante, parece entrar em contradição... Vejamos, o que o ilustre professor diz: «As sub-regiões criadas na Europa, como a do Báltico, Europa Central e Europa do Leste, têm sido desvalorizadas à medida que se vão integrando na União Europeia e na NATO».
Contradição essa, que nos parece ser evidente, porque a tese da UI defende a valorização e não o risco de uma desvalorização das regiões portuguesas que de “braço dado” com as regiões espanholas – que por si só, no seu todo (Espanha) já são reconhecidas, como a quarta maior potência europeia – se constituirão através de uma união federativa (União Ibérica) para um poderoso país ao nível da França ou Alemanha.
Por outro lado, considera-se imprevisível a “diluição da Soberania” do nosso querido país, como teme Sacchetti. Pela reconhecida razão que se verificou, em todos os países que se federaram e continuam a federar, por esse mundo fora. Onde sucedeu que o carisma (qualidade marcante) dos mais fracos passou a ser protegida pelos mais fortes com notável fortalecimento do conjunto. No “top” dos exemplos apontamos o que sucedeu aos EUA que, por via federativa, se encontra, actualmente, incapaz de refrear a seu engrandecimento – “a rebentar pelas costuras” – ao ponto de, agora, imperar no Planeta e não só... já se encontra no início da conquista e ocupação de objectivos astronáuticos. Convenhamos: por acreditar na ancestral verdade: «a união faz a força».
DE INDEPENDÊNCIA: Associação Fórum Açores Livres (FAL), “DN” 03/11/02: Dá cobertura ao independentismo açoriano. Um dos seus objectivos é «debater os desafios que se colocam ao arquipélago e à sua história, sempre na perspectiva de que um dia os Açores poderão ser livres e soberanos».
José de Almeida, “DN” 03/11/02, um dos sócios de peso da FAL: «Eu sou independentista e defendo a afirmação do estado açoriano. Queremos pensar os Açores livres e servir os Açores primeiro. Se com isso Portugal ficar também servido, melhor ainda. A Constituição não nos proíbe de defender esta causa só impede a sua defesa de forma organizada». JA, reafirma isto com a mesma convicção com que o fez no final da década de oitenta e era fundador da FLA (Frente de Libertação dos Açores) no período quente do pós 25 de Abril de 1974. Quando teve de enfrentar mais de cem processos espalhados pelos tribunais do país sob a acusação de independentismo.
DE INTERESSE ACADÉMICO: Doutor Mário Bettencourt Resendes, Director do DN, 20/11/02: «Portugal e Espanha vivem, desde Janeiro de 1986, um período ímpar na história do relacionamento dos dois países ibéricos. As democracias da Península consolidaram, ao longo de quasi duas décadas, laços bilaterais que prevalecem sobre as diferenças de orientação política das respectivos governos. Os benefícios foram mútuos, embora a desproporção de meios tivesse criado uma situação de facto favorável à pujança económica espanhola».
Doutor António Barreto, sociólogo, DN 07/12/02: «Mas o fim não se evita se continuarmos a dizer, estupidamente, que um país com oito séculos não desaparece. Se olharmos para a História há dezenas de países que desapareceram. Era bom que os portugueses, se mentalizassem que Portugal pode mesmo desaparecer, que podem ser incluídos noutras realidades, e que podemos já não ter tempo para negociar soluções nem educar pessoal. O tempo pode faltar.
Doutor Vasco Pulido Valente, DN 08/12/02: «Se António Barreto quer dizer que Portugal pode desaparecer como Estado, claro que sim. Perante a indiferença – e o aplauso – de quasi toda a gente, o que dantes se chamava a “soberania” portuguesa é dia a dia absorvida pela Europa, pela NATO e por uma multidão de organizações de beneficência duvidosa, que mandam cá dentro como em sua casa».
Doutor Manuel Durão Barroso, Primeiro-Ministro, em entrevista ao DN, 25/01/03: Afirma que «o mercado espanhol é prioridade».
General António Ramalho Eanes, Ex-Presidente da República, em carta a mim dirigida, 14/03/03: «Acuso a recepção de uma fotocópia do seu interessante trabalho sobre a União Ibérica (III). Felicito o camarada Mendonça Júnior, principalmente pela “provocação” saudável que este trabalho constitui. Creio bem que só os povos capazes de uma reflexão filosófica séria sobre a sua tradição e circunstancialismo presente (envolvente) conseguem reorientar-se e desenhar estradas de futuro. É assim porque, como dizia Ortega y Gasset, os povos não o são porque a cada momento se fazem ou desfazem pela – ou pela falta de – inteligência, vontade e acção dos seus filhos.
Interessante seria reflectir por que razão o Iberismo voltou a ser discutido, em todas as situações de crise nacional. Discutir, seriamente, a hipótese Iberista seria, sempre, salutar para o País. No mínimo, essa discussão levaria os portugueses, indirectamente, a : primeiro, a definirem, com rigor, o que querem e podem ser no futuro; depois, e em consequência, a estabelecer um grande propósito nacional, a exigir a definição das consequentes estratégias, a fiscalizar a sua gestão, a pagar conscientemente os custos que elas, seguramente, implicariam.
Continuar nesta modorra, não estabelecer Grandes Opções Estratégicas de Segurança Nacional, não cuidar de atribuir meios aos subsistemas sociais, e de exigir, para eles, a definição e a aplicação de uma estratégia é, seguramente, caminhar de crise em crise até, pelo menos, à completa integração económica na Espanha. Remeto-lhe fotocópia da opinião que esta questão mereceu a Pulido Valente (a 16 de Fevereiro de 2003), expressa em coluna trimestral no Diário de Notícias».
Doutor Vasco Pulido Valente, DN 16/02/03: «Duas dúzias de empresários ouviram muito «incomodados» o primeiro-ministro dizer que considerava a integração económica da Península «uma inevitabilidade». Portugal e a Espanha pertencem à União Europeia e à União Económica e Monetária (moeda única) e, ainda por cima, são uma particular espécie de vizinhos, que formam uma unidade geográfica visível, (...) O que interessa hoje é que a progressiva integração com a Espanha (e não só a económica) aproveite o país. O incurável provincianismo português talvez seja curável, se as pessoas circularem e viverem num mundo maior.
DE CONCORDÂNCIA: Jornalista Bélmiro Vieira, em “Carta Aberta: «União Ibérica: sim ou não e porquê», são as questões que Belmiro interroga numa sintética mensagem publicada no “O Dia”, 12/05/03. Começa por as situar dizendo: «Eis uma questão que, formulada inicialmente em ambiente restrito e de forma hesitante e quasi que a medo, ganhou, nos últimos tempos, amplitude e sonoridade públicas como testemunham muitas conversas de tertúlia que se vão escutando e bem assim os depoimentos que a Comunicação Social tem publicado».
Aborda frontalmente, o incontroverso real significado da expressão, UNIÃO, que formula a tese, em debate, da UNIÃO IBÉRICA: «como uma associação feita de livre vontade e de comum acordo, com a finalidade de coordenar e financiar meios e esforços próprios, para assim aumentar as possibilidades de triunfo num mundo em permanente e feroz competição». Acautela, intenções de soberania contra natura: «...as partes mantêm a sua personalidade, empenhando-se em tarefas comuns, com vista a assegurar uma vida melhor...». Refere, que perante as discrepâncias «que a Operação Iraque pôs a descoberto na NATO e EU» – perspectivando o fracasso de ambas – sublinha: «há na Península Ibérica muita coisa de semelhante ou de comum: como o espaço geográfico; os meios de expressão herdados os romanos e mesclados com contributos de outras origens; usos e costumes que, através dos tempos foram deixados pelos diferentes povos que por aqui passaram; e, “last but not least” – o último, mas não o menos importante – o culto religioso».
Termina: « Assim sendo, parece não haver dúvidas de que a união entre os que dão personalidade à Península Ibérica, as suas regiões portuguesas e espanholas, é necessária e desejável. Será ela – caso se venha a concretizar – uma força a considerar não só ao nível da Europa mas também à escala mundial sobretudo se, na sua formulação e funcionamento, não for esquecido o histórico relacionamento que os países ibéricos têm com a América Latina e com a África».
VISÃO ESPANHOLA
Josep M. Vallès, “El País”, Madrid 19/11/02: «A evolução da Espanha das autonomias pede também que este debate se faça num clima federal. Há sinais favoráveis para isso, pese embora a gesticulação unitária de quem os percebe e quer contestá-los, entrando em iniciativas de óbvia teatralidade. Quem se refere ao novo federalismo sabe que o termo “federal” evoca hoje uma concepção da política em que a unidade – de indivíduos, de povos – se faz a partir do reconhecimento da pluralidade e da diversidade».
Carlos Carderera, embaixador de Espanha em Portugal, em entrevista ao DN 21/01/03: «Temos pontos de vista diferentes Portugal pretende manter a rotatividade (UE). Espanha não». Porém, rematou: «Lisboa e Madrid estão no mesmo barco».
Manuel Fraga Iribarne, Presidente da “Xunta de Galicia”, em carta a mim dirigida, 28/01/03: acusa a recepção «de su artículo periodístico “União Ibérica (III)... a favor de la oportunidad de una “union europea” como forma de reforzar la mutua presencia de ambos países ibéricos en Europa y el Mundo». Termina: «Le agradezo mucho su gentileza y le envio mi felicitación y un cordial saluto». Assina com um «muito obrigado» escrito à mão.
(*) Coronel de Cavalaria.
Foi publicado no Jornal “O Dia” em 23/05/2003.
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